sexta-feira, julho 16, 2010

O Tango do Tanghetto

» CONCERTO


Argentinos se inspiram em Piazzolla e recriam o tango

Fabianna Freire Pepeu

Se o tango é por natureza mistura de vários ritmos, então não há de ser nada mesclá-lo, por sua vez, a uma nova série de influências musicais ou mesmo usar um controlador com bases eletrônicas e brincar com timbres, certo? Pelo sim, pelo não, quem foi ao Teatro da UFPE, no último sábado, assistir ao concerto do Tanghetto, é gente aberta a fusões e experimentos. Não foi apenas uma única vez que se ouviu gritinhos pedindo a versão da banda para Enjoy de silence, da inglesa Depeche Mode. Além do mais, a plateia era composta, em sua maioria, pelos que dançaram a New Wave.

O Tanghetto é um dos grupos argentinos da atualidade que tratou de, na carona do excelente trabalho de resgate do tango feito pelo Astor Piazzolla (1921-1992), na década de 1970 – e que muitas críticas recebeu por isso –, mostrar que essa música-dança, nascida no final do século XIX, merecia sair das fronteiras portenhas. Para isso, a banda prega a valorização das raízes do tango, que podem vir a sofrer fusões, ganhando, com isso, as graças do mundo contemporâneo, tão pouco afeito à tradição de qualquer ordem.

Apesar de o concerto ser de lançamento, no Brasil, de Más allá del sur, seu último trabalho, o que se ouviu foi um panorama do que a banda tem feito nos últimos anos. As novas Tango místico, La milonga e Zita – cuja original é uma música menos conhecida de Piazzolla – integraram o programa da noite, que trazia também canções dos discos Emigrante (2003), Hybrid tango (2004) e de El miedo a la libertad (2008). Sem falar na versão portenha para Blue Monday, do New Order, que aparece no álbum Buenos Aires remixed, lançado em 2005.

A primeira metade do espetáculo pareceu um esquente, mas, a partir dali o grupo foi num crescente, contando, inclusive, com a participação do público que, animado, acompanhou, com palmas ritmadas, a marcação das canções. Talvez um dos diferenciais da banda seja a mistura de sons realçada pela presença do erhu – instrumento musical com duas cordas, também conhecido como violino chinês – além do trabalho de sintetizadores e programação, feito por Max Masri, um dos idealizadores da banda. Na apresentação no Recife, participaram os músicos Federico Vazquez (bandoneon), bateria e percussão (Daniel Corrado) e Antonio Boyadjian (piano).

Impossível ficar imune a deliciosa sonoridade do erhu. Ela se harmoniza com a melancolia do tango tradicional, que aparece mais diluída nesse grupo que toca o que vem sendo apelidado de tango eletrônico. A plateia gostou e pediu bis, mesmo antes do concerto acabar. Na volta ao palco, o Tanghetto tocou Libertango, uma das mais famosas canções de Piazzolla, e Alexanderplatz, provavelmente criada a partir das memórias de Masri, que viveu em Berlim.

Muito legal a utilização de recursos de audiovisual – mostrados num telão no fundo do palco – para ilustrar as canções. Destaque para as imagens, possivelmente do início do século XX, de um casamento em uma área rural, no qual se dançam milongas, e para a correria das grandes cidades. Também muito bacana o material utilizado para Blue Monday. São imagens com interferências gráficas nas quais entrevemos inúmeras ruas e estações de metrô londrinas, tão inerentes à dinâmica da cidade.

(Publicado no Jornal do Commercio - Recife, 26/04/2010)

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