sexta-feira, julho 16, 2010

Experiência sensível de Carlos Mélo





» EXPOSIÇÃO

Artista reúne vários temas e suportes na mostra em Boa Viagem

Fabianna Freire Pepeu

A liberdade da arte contemporânea é sem limites. Alguns artistas mergulham em profundidade nessa ideia. É o caso do pernambucano Carlos Mélo, que, atualmente, divide sua vida entre o Brasil e Portugal. No Recife, ele inaugura amanhã, às 20h, na Galeria Mariana Moura (Av. Conselheiro Aguiar, 1552, Boa Viagem), a exposição Experiência sensível. A mostra reúne fotografias em jato de tinta sobre papel algodão, medindo 1,10x1,40, e ambientadas em Sintra, desenhos realistas em grafite sobre papel com 0,40x0,50, um curioso objeto – uma impressão a lazer de uma fotografia em 3D dentro de um cubo de cristal –, e um vídeo, além de uma performance, que será realizada, na noite de abertura, pelo próprio artista em parceria com um ator.

Experiência sensível é parte do seu Projeto Experiência Sensível, o P.E.S., iniciado em 2008, quando foi contemplado com o Marcantonio Vilaça, um dos mais importantes prêmios nacionais das artes plásticas. Além de exposição itinerante e publicação de catálogo, o programa garante aos selecionados uma bolsa de trabalho para realizar um projeto, a ser acompanhado por um crítico ou curador durante um ano. A crítica escolhida para orientar o artista foi ninguém menos do que a psicanalista Suely Rolnik, que também é professora da Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), tradutora e autora de inúmeros livros e ensaios sobre subjetividade.

“Ser acompanhado por Suely foi um presente da existência. Ela mudou a geografia do meu trabalho, mostrando que o mais importante é o processo de construção artística e, ainda, evidenciando a relação do meu corpo com o espaço, esse lugar que ocupo no mundo”, diz.

Sem dúvida, foi a partir desse diálogo que a sua relação com a criação artística mudou. Começou ele inventando o que chama de “subjeto”, um tipo de objeto subjetivo. Este é o nome que o artista dá a um chapeuzinho construído a partir de um boné com uma franja de missangas semelhante ao filá – adereço de cabeça usado em cerimônias do candomblé. Com a indumentária, vai em busca da “vivência sensível”. Assim, faz o que intitula performances sem audiência, acompanhado sempre de um fotógrafo, que registra essas “caminhadas”. É depois disso que vai construir os seus objetos. Ou não. Algumas vezes, são os próprios processos que ele expõe, como no vídeo presente na exposição em Boa Viagem, que documenta um passeio seu pelo Parque da Aclimação, em São Paulo.

“Os artistas acabaram se distanciando do que é sutil na construção da obra de arte. Houve muita concessão para o mercado. O que venho fazendo é esse resgate e, agora, não me vejo mais perdendo essa conexão com o sensível”, afirma ele, e, em seguida, complementa: “Sinto-me livre para criar o que eu quiser. Mudo de assunto e de suporte nessa poética sem coerência”, sentencia esse artista nascido em Riacho das Almas, no Agreste do Estado.

Talvez sua produção não seja tão incoerente assim, pelo menos, não aos olhos de críticos, estudiosos de arte e galeristas de referência. Eduardo Brandão, por exemplo, da Galeria Vermelho, em São Paulo, já disse certa vez que, “o seu trabalho não é uma daquelas obras de sucesso imediato, algo a ser vendido na primeira crise, mas que é um tipo de trabalho que vem sendo absorvido aos poucos e que sustenta uma geração”. Se é assim, então Mélo é um artista do futuro, e de futuro, pois sua vida profissional vem sendo construída tijolo por tijolo, ano após ano.

E o que mudou desde a sua primeira exposição (Carlos Mélo – Desenhos e colagens), realizada em 1997, no Instituto de Arte Contemporânea da Universidade Federal de Pernambuco (IAC/UFPE)? “Amadureci muito profissionalmente. Mesmo considerando algumas mudanças positivas na economia, a gente sabe o quanto é difícil nesse País se afirmar como artista e, mais do que isso, dar continuidade ao próprio trabalho. Poder continuar fazendo o que gosto e acredito é o grande barato”. Falou e disse.

(Publicado no Jornal do Commercio - Recife, 14/04/2010)

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