quinta-feira, julho 08, 2010

A Geografia da Violência

» EXPOSIÇÃO

A geografia da violência


Em sua individual, O auge do alôpro, o artista plástico Braz Marinho reúne objetos, esculturas, instalação e vídeo

Fabianna Freire Pepeu

O cidadão comum anda pela cidade a cumprir tarefas. Vai do ponto A ao ponto B e, dali, a um sem número de pontos: espaços no mapa. O artista não. Seu olhar penetra os aspectos cotidianos e neles encontra um mundo invisível. É assim, por exemplo, com o artista plástico Braz Marinho, que construiu a exposição O auge do alôpro (gíria que remete ao termo amalucar) a partir das chaves, correntes e cadeados utilizados diariamente pelos pequenos comerciantes do Centro do Recife.

Sua nova individual, cuja abertura ocorre hoje, às 19h, no Instituto de Arte Contemporânea da Universidade Federal de Pernambuco (IAC/UFPE – Rua Benfica, 157, Madalena. Fone: 3227-0657) é uma geografia da violência.

Objetos, esculturas, instalação e vídeo remetem a um único sentimento: o de medo. Um medo abstrato? “Não, não se trata de algo subjetivo. É medo objetivo de ser furtado, de ser roubado, de perder o que se tem, de andar pelas ruas”, explica Braz.

Tudo isso não é à toa. Em suas andanças pela Avenida Dantas Barreto, uma das principais do Centro do Recife, o artista viu banquinhos de madeira – roídos pelo tempo e de pernas já tortas – serem protegidos com longas correntes e até um velho Fusca viu ser acorrentado.

O artista então é tomado por um sentimento de extrema agonia e vai em busca da (re)construção possível de um mundo mais suave. Assim utiliza madeira, arame retorcido, aço, alumínio e tantos outros materiais densos e duros, mas a eles soma a maciez do veludo como no objeto So velvet (literalmente: tão aveludado). Mas, ali também visualizamos pedaços de aço a lembrar pontas de faca afiada maculando o tecido suave.

OBJETOS

Além de So velvet, que mede em torno de 50 cm x 50 cm, a exposição reúne seis outros objetos: Momento lúdico com band-aid, Fronteira de ex-domínio – que são três peças distintas com desenhos a partir de ferro retorcido –, Alicate e Contenidos – bloco sólido de madeira que sustenta pequenos fragmentos, também em madeira.

Entre as esculturas, destaque para as belíssimas Homem estreito (madeira com alumínio) e Cadeira para o homem estreito (madeira com inox), ambas medindo 2 m x 0,08 m, com predominância da madeira em sua composição. A aparente desproporção de medidas tem um sentido. “De tão pressionado, o homem ficou assim. Ele é estreito porque não conseguiu resolver como modificar essa situação de coisas”, diz Braz. Ah, claro...

E se tudo têm nome nessa individual do premiado artista de 48 anos – nascido em Souza, na Paraíba, e há muito tempo adotado por Pernambuco – o mais longo ficou para a instalação, que se chama Onde está a chave do armário da chave do armário das três chaves?

É quando o trágico se une ao cômico. A instalação, composta por uma infinidade de chaves de diferentes formas e tamanhos, nos fala de tudo o que está fechado e guardado. Ali perto dois pequenos armários em madeira – igualmente trancados – guardam chaves que, por sua vez, guardam um outro algo, como a lembrar dos segredos guardados a sete chaves. No chão, uma tampa de ferro, obviamente muito lacrada, protege uma bomba d’água ou uma fiação elétrica. Não sabemos ao certo o que está protegido e já nem importa. Importa saber que tudo parece em perigo e que os gatunos nos espreitam.

VIDEOARTE

É possivelmente o vídeo a peça da exposição que serve de instrumento de síntese para todas as outras. Com cinco minutos de duração (a trilha sonora é de Grilo e a fotografia de Francisco Baccaro), ele mostra uma personagem (encenada pelo próprio Braz Marinho) que, ao vivenciar inúmeras situações de violência, desenvolve um medo crônico, passando a experimentar uma situação-limite, paranoica, que tende à explosão.

Uma das cenas do vídeo, que foi ambientado em diversos cenários, foi reproduzida na sala térrea do IAC. Durante o vernissage desta noite, o artista Wolder Wallace vai fazer uma performance. O que vai ocorrer? Por enquanto, é segredo de Estado.

(Publicado no Jornal do Commercio - Recife, 30/06/2010)


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